O poder simbólico da comunidade no desenvolvimento

Por: Cátia Cardoso

Quando as pessoas se juntam por objetivos comuns à sua concretização torna-se não só mais possível, como passa a adquirir robustez, através de novas ideias e energias, que visam resultados iguais ou semelhantes. É também por isso que cinco freguesias do concelho de Arouca se encontram a desenvolver fóruns comunitários, que procuram colocar cada comunidade a pensar, em conjunto, sobre a sua situação, bem como a desenvolver soluções para problemas identificados. 

Estes fóruns sociais partem de uma iniciativa que envolve a ADRIMAG, o projeto Aroucainclui, a rede social do município e, principalmente, as comunidades onde se estão a desenvolver, sendo coordenados por Rogério Roque Amaro, docente no ISCTE e especialista na área do desenvolvimento e da economia social. Assim, todos os agentes sociais são chamados ao fórum (empresários, dirigentes associativos, autarcas, moradores,…) para ouvirem e participarem na discussão e, posteriormente, na ação. 

Em boa verdade, a ideia de pessoas que se juntam, identificam problemas ou interesses comuns e procuram criar soluções que vão ao encontro das suas necessidades ou desejos é um princípio – ou deve ser – de qualquer grupo, pelo menos formal, como as associações. Do ponto de vista metodológico, parece, assim, não haver nada de novo. O que distingue, então, estes fóruns comunitários de, por exemplo, uma associação local com determinado fim? Desde logo, a experiência no terreno do orientador dos fóruns, bem longe da inexperiência em gestão de recursos humanos voluntários que, muitas vezes, existe em dirigentes associativos. Depois, a informalidade do projeto, a desobrigação de participação em todas as reuniões, bem como a sua realização descentralizada, como se tem verificado na União de Freguesias de Canelas e Espiunca. Evidentemente que, como qualquer projeto comunitário, este também só funciona se e quando a comunidade quer e, ademais, da forma que a comunidade pretende. 

Na referida União de Freguesias, foram elencadas como prioridades a juventude (como chegar hoje em dia aos jovens? Quais são os seus interesses? Como os envolver nas dinâmicas da comunidade?); os séniores (como combater o isolamento em lugares como Vila Viçosa, onde é considerável o número de pessoas com teleassistência? Quais as principais necessidades, medos e anseios dos séniores da União de Freguesias? Que histórias têm para contar?); e ainda as acessibilidades (envolvendo questões dos transportes, das vias de comunicação, mas também das acessibilidades digitais, nomeadamente a fragilidade da internet em Canelas e Espiunca). 

No seguimento, foram chamados a este fórum também os grupos de catequese, o executivo da Junta de Freguesia e, também, jovens. Cada uma destas partes ficou encarregue de idealizar uma iniciativa, tendo as ideias já sido divulgadas nas redes sociais da União de Freguesias. Na época de natal, os grupos de catequese visitam idosos dos lugares de Vila Cova, Vila Viçosa, Serabigões, Mealha, Gamarão,…, tendo promovido momentos intergeracionais e registado receitas antigas de natal, entre outras histórias…ou estórias. Disse quem participou que foi uma iniciativa enriquecedora, daquelas que enchem o coração, vincando a vontade de lhe dar continuidade e não apenas na quadra natalícia.

Este é um exemplo simples, fácil de colocar no terreno e que, parecendo não ter um impacto prático, tem um poder simbólico…e já devemos saber que precisamos do simbólico para viver (ler “O poder simbólico”, de Pierre Bordieu). Posteriormente, outras iniciativas serão levadas a cabo, como uma programação dedicada ao desporto e à saúde, idealizada pelo executivo da Junta de Freguesia. De notar, desde já, que este foi um mecanismo que despoletou a presença de jovens em momentos de discussão e decisão sobre o desenvolvimento de Canelas e Espiunca. E, por isso só, podemos sublinhar que já valeu a pena iniciar este processo nesta comunidade. 

Muitos continuarão a achar que o simbólico não serve para nada. Mas, as almas vazias só reconhecerão o seu vazio quando se deixarem preencher por algo. É mais ou menos assim com a arte e a cultura, e é também assim com o social. E num século de individualismo e egocentrismo, é sempre delicioso ver acontecer sociedade, na esperança de que até o simbólico terá um uso, com valores e princípios a correrem o risco de ser incorporados em cada pessoa e nas dinâmicas de uma comunidade, que, por sua vez, se desenvolve a partir de valores e princípios (o que se torna cada vez mais raro).

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Cátia Cardoso
Discurso Direto
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